Botafogo vence o Bragantino com golaços de Júnior Santos
O responsável por aprová-lo no Osvaldo Cruz tinha consciência de todas as qualidades e limitações do então atleta de 22 anos. E o preparou rumo a desafios maiores, como a Conmebol Libertadores de 2024. Mesmo sem os dois saberem.
Ex-lateral de Flamengo, Bahia, Goiás, Guarani, Ponte Preta, Sport e União São João, Luciano Baiano foi o primeiro técnico profissional de um jogador que não passou pelas categorias de base.
Direto de Ilhéus, na Bahia, o profissional de 47 anos relembrou as histórias com o atacante enquanto dá uma pausa na carreira de treinador. Entre elas, estão os dias anteriores à avaliação e aprovação no Ituano, responsável por fazer o atleta saltar da quarta para a primeira divisão estadual em poucos meses.
– Quando acabou o campeonato, fomos eliminados, ele foi para casa, passou dez, 15 dias, voltou e ficou comigo até o último dia antes de ir para o Ituano, principalmente treinando finalização. Ele chutava de peito de pé, de qualquer jeito. E eu sou muito chato com essas coisas de bater tirando, chapar a bola quando está próximo do goleiro. Chegou uma hora, de tanto chapar, que o adutor dele até sentiu. Teve que ficar fazendo gelo. Mas conseguiu evoluir. Foi muito trabalho.
Júnior Santos no primeiro ano como profissional, em 2017 — Foto: Arquivo / ge
O episódio mostra como era a relação entre Luciano Baiano e Júnior Santos há sete anos, a qual ultrapassava os limites do campo e lembrava a de pai e filho. Os dois foram protagonistas da última temporada de alegrias de um clube fundado em 2004, dono de três acessos e inativo no futebol profissional desde 2022 por não ter estádio para mandar as partidas. O palco dos treinos e gols de Júnior Santos, o Breno Ribeiro do Val, se encontra em obras.
Santos? Não, ali ele era Júnior Berimbau, levando para os gramados o apelido da cidade natal, Conceição do Jacuípe, perto de Feira de Santana, na Bahia.
O atacante fez cinco gols em 2017, os últimos três do Azulão no campeonato sub-23, nas fases decisivas. Vestia a camisa 10 e fazia uma dobradinha empolgante na cidade de aproximadamente 31 mil habitantes, localizada a cerca de 600km da capital, no Oeste Paulista. Ao seu lado estava Felippe Cardoso, ex-Fluminense e Santos e atualmente no Casa Pia, de Portugal.
– Ele jogava na minha cidade, no campeonato amador de Valença. Um amigo meu falou: “Tem um atacante bom aqui na cidade, só que já está muito velho. Acho que nem dá para disputar o campeonato aí.” Eu falei: “É o último ano, dá sim. Manda aqui para fazer teste, vou avaliar.” Avaliei, gostei da força, tinha muitos defeitos, um milhão. Durante a competição, ele foi evoluindo. Quando chegou, recebeu muitas críticas por não entender o jogo, mas com o tempo, foi trabalhando. No final do campeonato, conseguiu se destacar – disse Luciano Baiano.
– O trabalho foi duro, pois era um atleta do amador, nunca tinha jogado profissional, não tinha noção de nada, não sabia nem se posicionar em campo. Mas tinha muita força, velocidade e qualidade no drible. Quando estava próximo de acabar a competição, com a idade dele ultrapassada, estávamos preocupados com o futuro. Entramos em contato com um empresário, falamos do Júnior, do talento, do destaque. O empresário relutou por causa da idade. Insistimos. Eu falei: “Pode levar para fazer teste em qualquer clube que vai ser aprovado” – completou.
Como Júnior Berimbau, atacante se destacou em estádio sem receber partidas há dois anos — Foto: Arquivo / ge
Peça importante na reorganização do Osvaldo Cruz e no aval para a contratação do atacante, o então presidente e hoje à frente do Conselho Deliberativo, Rubens Romanini, revelou que, em 2017, os atletas não tinham salários fixos no clube. Havia premiações conforme os resultados esportivos. O maior prêmio ocorreu em uma classificação com dois gols de Júnior Santos.
– Naquele dia, eles ganharam R$ 10 mil para dividir entre eles.
– Os jogadores ganhavam um valor por vitória e, no fim do mês, a somatória era próxima a de um salário mínimo. Quando perdiam, ficavam loucos. O Júnior veio para o clube e deixou mulher e filho na Bahia. A gente sempre ajudava ele. E o Luciano tratava os atletas como uma família – falou Rubens.
Confraternizações organizadas por Luamar, esposa de Luciano Baiano (ambos ao centro), como no Natal, reuniam Júnior Santos, Felippe Cardoso e atletas do Osvaldo Cruz em 2017 — Foto: Luciano Baiano / Cedida
Para os vícios de um atleta amador de 22 anos serem tirados e substituídos por qualidades necessárias na hora de marcar dois gols em um confronto eliminatório de Libertadores, houve um treinador o qual teve paciência e fez a lapidação. Um técnico que, mesmo distante, sem manter atualmente contato próximo ao jogador, segue na torcida pelo sucesso do pupilo.
Como alguém que conhece tão bem o atleta, Luciano Baiano indicou o caminho para o atacante se manter em boa fase. Conforme o treinador, times com muita posse de bola não são compatíveis ao estilo de jogo dele. A torcida do Botafogo agradece a dica!
– O Júnior precisa de espaço, funciona em equipes reativas. O Fábio Matias está dando muita liberdade para ele. Quando a equipe adversária passa a se expor, e os zagueiros ficam em uma linha perto do meio-campo, ao perderem a bola, o Júnior tem vários metros para disparar. Aí ele se destaca como poucos, pois tem muita força e velocidade.
Atacante fez dois gols contra o Bragantino, na terceira fase da Libertadores — Foto: André Durão